“As plataformas gratuitas são um prato cheio para quem tem coragem de arriscar”

O período é promissor para e-books. “Se as editoras e distribuidoras vêm tendo dificuldade, as plataformas gratuitas são um prato cheio para quem tem coragem de arriscar. É uma tendência inegável, desde que publiquei meu primeiro livro em 2011: só aumenta!”. A afirmação é da escritora Carolina Vila Nova, autora de 14 livros já publicados e com vários projetos inéditos em fase final.

Como o meu objetivo com este trabalho é incentivar a leitura, além dos clássicos e dos top 10 da moda, e ainda destacar escritores brasileiros e seus trabalhos, falei com Carolina Vila Nova, que atendeu a solicitação e respondeu descontraidamente sobre como é essa profissão e esse nicho de mercado.

O que me chamou atenção na obra de Carolina foi a publicação de “A Pandemia no Prédio 295”, lançado em maio de 2020, com a factualidade de uma notícia e escrita em diálogo do início ao fim. Mesmo com o gênero comédia, a obra traz lições de moral e reflexões sobre a vida contemporânea, impactada pela pandemia.

Conhecia outra obra de Carolina, na qual percebi uma personalidade multitarefas e dinâmica. Brasileira como todos nós, que teve o privilégio de viver em outro país, mas está no Brasil empreendendo na arte da escrita. Então vamos conhecer Carolina Vila Nova neste ping-pong exclusivo para estreia do quadro Escritores do Brasil.

CK – Quem é Carolina Vila Nova?

Carolina Vila Nova – Alguém que escreve desde criança e bem mais tarde encontrou seu propósito de vida na escrita. Toda motivação, alegria e vontade de seguir em frente vai por este caminho, onde aprendo a cada dia num nível mais profundo os significados das palavras: perseverança, aprendizado, compartilhar e fé. Brasileira, 44 anos, poliglota com experiência de vida de 6 anos na Alemanha, fui professora no país e depois retornei ao Brasil em 2011. Trabalhei neste retorno como Assistente Executiva Trilíngue em multinacional alemã.

Sofri e cresci no mundo corporativo por um tempo e hoje sou feliz na arte e independência de criar e trabalhar sem qualquer fronteira

(Leia-se aqui: regras, processos engessados, cultura organizacional tóxica, competitiva e individualista, colegas que não respondem e gestores que compreendem pouco e acreditam que sabem muito).

CK -Como você se define? Em qual cidade você mora? Tem filhos, tem cachorros, gatos? No dia a dia, o que faz, o que gosta de fazer?

CVN – Hoje me defino livre, feliz, porém sempre crescendo, aprendendo, aberta a novas percepções e experiências. Moro em Sorocaba, tenho um filho de 25 anos, Gabriel e um gato chamado Sinhozinho Leôncio. Estou quase sempre escrevendo e lendo, especialmente na pandemia. Amo água, nadar, rios, cachoeiras, natureza e o sentir o vento batendo no rosto. Atualmente me defino como introvertida, sou feliz sozinha, tenho poucos e excelentes amigos (aprendi a me afastar dos que apenas fingem ser) e por mim moraria no meio do mato, perto de um rio, com muito verde e vento batendo em meu rosto. E com uma boa chuva regularmente.

CK -Quantos livros já publicou?

CVN – Como autora, tenho 14 livros já publicados, mas “despubliquei” alguns, que pretendo reescrever com mais técnicas. (Separei acesso para alguns no final do texto)

Também já escrevi vários livros e roteiro como Ghost Writer, mas nem todos foram publicados ainda.

Tenho vários livros inéditos a publicar, que venho retrabalhando e planejando estratégias mais inovadoras e eficientes (marketing!) para um alcance e visibilidade maiores do que nos anos anteriores. Não é um trabalho muito fácil, existe o famoso caminho das pedras, que é único para cada um. Então, estou sempre tentando coisas novas, mas sempre escrevendo.

CK -Você chama de dom, paixão ou profissão o gosto pela escrita?

CVN – Eu chamo de tudo isso e muito mais! Nasci com o dom e sempre me senti apaixonada por isso, só não me dava conta antes, do quanto o escrever nasceu comigo, enraizado em minha alma. A profissão veio muito tempo depois, mas creio que foi algo necessário, porque entre um momento e outro, vivenciei inúmeras dores, frustrações, decepções, tudo aquilo que nos molda como pessoas mais fortes, perseverantes e de valores renovados.

Em outras palavras, acredito que um bom escritor é alguém mais maduro, que tem experiência de vida, antes de tudo. Antes de escrever: a dor, o amadurecimento e a compreensão sobre a vida em níveis mais profundos.

(Exemplo: o casar, divorciar, ter que criar um filho sozinha, enfrentar problemas sérios sem apoio, sofrer humilhações, trapaças, decepções, etc. Tudo isso nos ensina e nos molda como pessoas melhores e mais aptas a escrever, uma vez que escrevemos a maior parte do tempo sobre pessoas (personagens) e para pessoas. É importante que se entenda a si mesmo para depois compreender o outro).

CK -No livro Minha Vida Alemanha, você disse que as pessoas perguntavam como era a vida por lá e por isso você resolveu escrever. Como foi isso?

CVN – Foi bem difícil, porque durante os seis anos que eu vivi na Alemanha me senti extremamente sozinha, não tinha companhia e quem estava no Brasil não compreendia o nível de solidão e preconceito que eu vivia. O “ser estrangeiro” por si só já é algo muito difícil, porque é um momento que nos desconectamos de tudo aquilo que acreditávamos ter e ser, como o não falar mais a própria língua, não poder se comportar como antes, usar roupas diferentes, ter que chamar todo mundo de “senhor, senhora”, perder a presença dos amigos e da família, não ter mais o mesmo trabalho e nem vivenciar mais a própria cultura. Tudo se torna diferente. E na Alemanha existe uma dificuldade muito grande de integração para um estrangeiro. A verdade é que estrangeiro não é realmente bem-vindo. É muito difícil aprender o idioma, quando todo mundo olha torto para você quase que o tempo todo. Também há a questão da temperatura e luz, que no inverno, é algo inimaginável para os brasileiros que nunca tiveram essa experiência. O que nós, brasileiros, consideramos inverno, lá dura cerca de oito meses. E o verão cerca de um a dois meses. E ainda durante o inverno, anoitece às três horas da tarde, é algo horrível, pois não temos a luz do sol por muitos meses, não há uma trégua entre um dia frio e outro. É muito tempo entre o dia que esfria até o dia que começa a esquentar novamente, são meses a fio. Não se conhece isso no Brasil. E acredite: é dolorido.

Além de muito preconceito ou falta de aceitação, como cada um preferir compreender.

Quando eu tentava explicar às pessoas as minhas razões por não gostar de morar na Alemanha, ficava claro que eu não era compreendida e eu realmente desejava que alguém me compreendesse, porque isso não acontecia. E depois que escrevi o livro, aconteceu. Inúmeros brasileiros e estrangeiros leram o meu livro e se viram nele. Então eu percebi que não estava sozinha naquela experiência. Eu resumiria em uma palavra: tristeza. Apesar de todo crescimento que isso me trouxe.

CK – No livro A Pandemia no Prédio 295, você explorou o factual e falou da vida agora. Escreveu e publicou em tempo recorde. Conte como foi essa experiência e de onde vieram os personagens.

CVN – No final de 2019, eu tive um livro aprovado por uma das maiores agentes literárias do país para ser publicado juntamente com ela, finalmente, por uma grande editora, o que é como ganhar na loteria quando se é escritor. Com a pandemia, fui obrigada a deixar essa publicação em Stand By (um dos livros inéditos que citei anteriormente).

Foi muito frustrante para mim este fato. O realizar um sonho e depois ver que ele ainda não se realizou de verdade. E vai se realizar? Não sei. Penso que sim. Mas, quando? Essa trajetória me paralisou algumas vezes, porque é muito difícil você se ver “chegando lá” inúmeras vezes e não chegar de fato. Ainda que eu saiba do quanto cresci e sou melhor hoje, tanto como pessoa, quanto como profissional, a decepção de ainda não ter alcançado o que quero, no nível que eu quero, confesso que me dói a alma.

Ouvi de um grande amigo e meu Mestre na escrita, James McSill, que o livro em questão havia ficado obsoleto com a pandemia, porque sempre devemos publicar algo contemporâneo. Também me senti um pouco frustrada ao ouvir esta verdade. Com isso, decidi: então vou escrever um livro já, agora, antes que a pandemia acabe. Quer algo mais contemporâneo do que a pandemia?

Escrevi então uma comédia, utilizando de todas as técnicas que aprendi e hoje sinto que tenho um bom domínio, de forma que o livro fosse algo leve e engraçado sobre um momento que tem sido tão pesado para todo mundo. O livro tem lições de moral, leva a reflexões, mas de uma forma extremamente sutil, o que eu gosto muito. Apesar de ter havido uma razão pessoal para escrever sobre o tema, que foi a minha frustração, eu também queria poder tornar o momento mais leve para quem tivesse acesso a essa história.

Os jornais e a internet ficaram muito pesados, sofridos. E eu queria algo que fosse bem diferente disso, uma válvula de escape.

Os personagens vieram todos da minha cabeça, embora o nome da personagem principal, que é a Diná, seja o mesmo da zeladora do meu prédio, que tem o número 295 e por isso o número 295 no nome do livro. Algumas pessoas inspiraram alguns personagens, como a médica e o síndico, mas a maioria é só inspiração minha mesmo.

CK – Sei que você deu aulas, mas também é escritora. Fale sobre isso e se faz mais alguma coisa, conte também?

CVN – Tenho um currículo muito eclético, muito mesmo. E longo. Isto por dois motivos. Primeiro: eu não sabia o que queria da vida, e já dizia Shakespeare: quem não sabe para onde vai, qualquer lugar serve. Segundo: sou extremamente inquieta, gosto de mudanças, me sinto motivada a desafios e coisas que não conheço, por isso, mudei e continuo mudando sempre. Mudei de faculdade duas vezes (estudando 3 no Brasil e mais 2 na Alemanha). Mudei de trabalho várias vezes, cursos, cidades, esportes, relações. Acho que até um determinado momento foi muito, mas em tudo aprendi. E gosto deste meu comportamento bem mais do que aqueles que nunca mudam, porque sei o quanto eu aprendi em tudo que fiz.

Fui professora muitos anos, trabalhei como analista de sistemas, assistente executiva trilíngue e várias outras funções. E há dez anos sempre sendo escritora e roteirista, paralelamente.

CK – Como você vê o mercado de e-books e de livros de capa comum, no Brasil?

CVN – Promissor para e-books. Se as editoras e distribuidoras vêm tendo dificuldade (e espero muito, de todo coração, que se recuperem), as plataformas gratuitas são um prato cheio para quem tem coragem de arriscar. É uma tendência inegável, desde que publiquei meu primeiro livro em 2011: só aumenta!

Capa comum é o meu queridinho, adoro ler um livro ainda no formato padrão. Acredito que estamos vivendo um momento lindo, porque todos podem publicar um livro, existem inúmeras editoras de auto publicação, trabalhos como o meu, de Ghost Writer, que ajuda pessoas a alavancarem suas histórias, ideias, empresas e sonhos. Não publica quem não quer ou não corre atrás.

O livro de capa comum é um meio para se ter visibilidade e credibilidade em qualquer trabalho ou profissão. Um livro ajuda a divulgar histórias, trabalhos, empresas, ideias, sonhos e tudo mais.

Sem contar os grandes escritores que vão continuar escrevendo e nos presenteando com boas histórias em livros de capa comum e e-book.

CK – Acompanho o seu perfil no Instagram e vejo que o público dá bons feedbacks. Como você lida com isso?

CVN – Eu quase choro, literalmente. Como quando você publicou sobre o meu livro. É um presente, um bálsamo numa alma cheia de feridas e cicatrizes de uma estrada de pedras e espinhos. Um leitor que se encontra num de meus trabalhos é o remédio que me ampara e me dá forças para continuar. Acho que o melhor exemplo, talvez seja o do primeiro livro. Eu queria me explicar, porque já me sentia sozinha em todos os sentidos. E quando milhares de leitores compraram e leram o meu livro, eu finalmente parei de me sentir só. Isso não tem preço. Eu não busco a fama da minha pessoa, rosto ou coisa do tipo. Por mim, nem estaria nas redes sociais, elas são hoje ferramentas obrigatórias para quem quer crescer. O meu objetivo é ver o meu trabalho crescer e poder viver assim até morrer: escrevendo!

CK – Comente outros projetos, outras obras.

CVN – Escrevi um roteiro para uma peça de teatro sobre ELA – Esclerose Lateral Amiotrófica em 2017. Foi uma experiência marcante em minha vida. Obra encomendada por alguém famoso, que trabalha em emissora de televisão e com teatro. Senti que meu trabalho era visto, como tanto sonhava. Houve um “antes e depois” desta experiência. O projeto foi aprovado pela Lei Houanet, mas ainda não se concretizou na prática.

Fui convidada a escrever o roteiro de um filme junto com um amigo roteirista para o James McSill, o que também ficou em Stand By por causa da pandemia. Creio que será uma das experiências mais incríveis da minha vida.

Tenho muita coisa em mente, sempre voltado a escrita: livros, roteiros, conteúdo para canais, sites, TV, novela, séries, enfim. Gosto da sensação de compartilhar o meu dom com quem não tem esta expertise. Existe uma troca no processo de criar, que agrega sempre os dois lados ou todos os lados de quem participa de um processo de criação.

Me sinto muito aberta a tudo que chegar em minha vida neste sentido. E espero que chegue muito. Muito mesmo!

CK – Conte coisas curiosas que já aconteceram por ser escritora.

CVN – Bom, tem gente que acha lindo o fato de eu ser escritora. E tem gente que não. Certa vez, fui comprar algo e o meu CPF apareceu para esta pessoa e empresa como estando negativado, mas era um problema relacionado ao meu divórcio. Me senti constrangida e não quis nem explicar, achei que seria papo de caloteiro, então paguei o que queria à vista e abri mão das parcelas, que havia solicitado antes. Pouco depois, esta pessoa me perguntou se eu era a escritora Carolina Vila Nova e eu disse que sim. Então ele me contou que sua professora na faculdade de pós-graduação usava meus artigos nas aulas. Eu mal pude acreditar, isso ocorreu há uns oito anos. Naquele momento eu percebi que não precisava explicar mais nada, pois quem acompanha os meus textos, me conhece profundamente e sabe que eu jamais seria uma caloteira. Em resumo: eu vivia uma situação pessoal que de certa forma quase afetou a minha reputação, mas o trabalho da escrita, invisivelmente, me salvou. Eu achei lindo!

CK – Conte-me algum sonho, algum desejo.

CVN – Acho que o maior de todos é me tornar uma escritora muito conhecida, de renome, um orgulho para minha família e para o Brasil, de alguma maneira. Espero fazer trabalhos que agreguem as pessoas de alguma forma, quero ser útil, trazer coisas boas para as pessoas. No mais, sonho o que todo mundo sonha: ver meu filho feliz, ser avó um dia, ver meus pais viverem bem o máximo que puderem e ser uma pessoa melhor. Isso eu sonho e me pergunto sempre, como ser uma pessoa melhor a cada dia, porque percebo claramente os pontos que melhorei, mas sei os que ainda tenho que melhorar. É um processo que nunca para. Espero me sair bem nele.

Clique e conheça alguns livros de Carolina Vila Nova:

A Pandemia no Prédio 295

Minha vida na Alemanha

O beijo que dei em meu pai: Reflexões sobre comportamento, amor e outros temas

As Várias Mortes de Amanda

O Milagre da vida: Reflexões sobre filhos, infância, educação e outros temas

A Dor de Joana

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